Esse bordado inacabado, nesse cânhamo já todo manchado, vaga
de casa em casa, sempre confinado em gavetas diversas, conhecedor das
profundezas do escuro, há setenta e um pouco mais de anos. Já se impregnou de cânfora,
sentiu o conforto do papel de seda branco, o receio da traça, o pó, o
esquecimento. Seu projeto, que remonta aos confins, foi olhado e palpitado por
olhos de mãe, filha, irmã. O planejamento foi feito, é de se observar: o corte
do tecido, a escolha das cores, o tipo de ponto, o arrumar das linhas. Trama e urdidura sentiram o calor das mãos, o
arrepio da agulha fincando-lhes com novas tramas e urdiduras. Esse pedaço de
pano caiu nas mãos de sobrinha que fica a se perguntar: tão pouco para seu
término! Por que esse quase vazio? Foi o desencanto do desmanchar ou foi uma
tristeza de amor? Foi um projeto para compor um antigo enxoval, um noivado
desfeito? O cânhamo com suas nódoas, o bordado já feito, permanece silente. Fev.2015
8 de fev. de 2015
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